O atraso da Saraiva: como sair desta armadilha
Em novo artigo, André Castro faz uma análise sobre a atual situação da Saraiva a partir das ‘Cinco Forças de Porter’
No final do mês de março, o mercado editorial foi surpreendido pela notícia de que a Saraiva pediu uma prorrogação de três meses para pagar as editoras.
Essa prorrogação chama muita atenção pois estamos falando de um cliente que já possui condições comerciais extremamente vantajosas com as editoras. Os produtos são enviados em consignação e com um prazo de pagamento que chega a 120 dias.
A questão que fica é: por que a Saraiva, mesmo contando com inúmeras vantagens, não se intimidou a querer ainda mais?
O que melhor explica essa atitude da livraria é a ferramenta estratégica conhecida como as Cinco Forças de Porter.
Este modelo, criado pelo professor e pesquisador Michael Porter, mudou a forma como devemos entender competição. A maioria ainda acha que competição é apenas uma disputa direta entre rivais. Uma editora considera que compete apenas com outras editoras. No entanto isso é um pensamento muito limitado. Competição não é ganhar das outras editoras. É, na verdade, obter lucros.
Nessa disputa por lucros, uma empresa compete com cinco forças:
- Clientes: sempre vão querer pagar menos – é o caso da Saraiva;
- Fornecedores: querem receber mais e entregar menos;
- Ameaça de substitutos: produtos e serviços que podem substituir o livro;
- Concorrentes em potencial: a ameaça de novos entrantes impõe limites a quanto se pode cobrar dos clientes;
- Competidores existentes: assim como os potenciais, também impõem limites sobre o quanto se pode cobrar.
Essas cinco forças determinam a estrutura de lucro em um setor. Quanto mais força cada um deles tiver, menos lucro a editora terá.
Na relação entre Saraiva e editoras – principalmente as de trade –, quem tem mais força? Obviamente que é a Saraiva. Em alguns casos, a livraria representa 25% do faturamento das editoras. Provavelmente nenhuma editora possui tamanho peso no faturamento da Saraiva.
Quanto mais força um cliente tiver, mais ele utilizará sua influência para obter melhores condições comerciais, diminuindo, assim, o lucro das editoras. Exatamente o que a Saraiva está fazendo.
O que uma editora pode fazer em uma situação como essa?
No curto prazo, muito pouco. Dentro do possível, tentar não concordar com tudo o que for pedido. Talvez, em lugar de três meses de prorrogação, conseguir “apenas” dois meses. Mas não conseguirá muito mais. A força da Saraiva é imensa.
No médio e longo prazo é que podemos encontrar uma melhor solução. E a única saída é diminuir a força da Saraiva em negociações futuras. E a forma de fazer isso é diversificar as fontes de receita, fazendo com que a livraria tenha menos representatividade no faturamento.
Buscar parcerias com livrarias menores e, principalmente, aumentar as vendas para outros canais pode ser a saída. A pesquisa SNEL nos mostra que 47% das vendas de livros não se dão no canal livraria. Existem canais com elevada participação, como distribuidores, vendas diretas, vendas por catálogos, vendas em igrejas e em escolas.
Sua editora vende para esses canais? Se sim, ela dá a devida atenção a eles? Não seria possível aumentar a participação desses canais na sua empresa?
Sabemos que dá trabalho abrir um novo canal. Em geral, existem custos envolvidos. Mas se faltava estímulo para desenvolver esses outros canais, agora não falta mais. O preço de ficar parado será sempre estar fragilizado nas negociações com os grandes clientes.
Fonte: Entendendo Michael Porter: o guia essencial da competição e estratégia. HSM Editora, 2012